STJ reconhece legitimidade de associações civis em ações coletivas
Associado ou não às entidades, qualquer cidadão pode ser defendido em causas que envolvam interesses da coletividade. Decisão também inova ao afirmar que as ações coletivas são um direito da sociedade, podendo qualquer associação civil, com representatividade, suceder outra de igual natureza mas que tenha sido extinta ao longo do processo.
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão unânime, reconheceu a representatividade de associações e entidades civis que defendem os interesses da sociedade na Justiça nas chamadas ações coletivas.
A causa, cuja autoria é do Instituto Defesa Coletiva (IDC), tratava da abusividade na cobrança, em contratos de financiamento de veículos, de encargos denominados “promotoria de venda”, “taxa de gravame eletrônico” e “taxa de serviços de terceiros”.
O IDC argumentou em juízo “que não devem ser confundidos os institutos da substituição e da representação processual, pois a legitimação para a defesa de interesses transindividuais tem natureza extraordinária, agindo o legitimado em nome próprio na defesa de interesse alheio – dos consumidores substituídos – desde que satisfeitos os requisitos da pertinência temática e de constituição há pelo menos um ano”.
A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso no STJ, reconheceu a legitimidade do IDC e reiterou que as associações civis definem, em seu próprio ato de criação, os seus objetivos institucionais, o que já as autoriza a defender interesses coletivos. As associações agem como substitutos processuais sendo desnecessária, portanto, autorização do filiado ou deliberação em assembleia para que a entidade defenda os direitos da coletividade.
Também ficou definido que não há necessidade da pessoa ser filiado à associação para ser beneficiado pelo resultado da ação judicial.
Repercussão Geral
O acórdão do STJ acaba por jogar luz sobre o Tema 499, que teve repercussão geral reconhecida e analisada recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em dois Recursos Extraordinários (RE 573.232/SC e RE 612.043/PR), onde ficou expressamente delimitado que as ações coletivas de consumo ou quaisquer outras que versem sobre direitos individuais homogêneos devem seguir o rito especial e não o ordinário, mas não ficou clara a extensão de seus efeitos.
Segundo a ministra Nancy Andrighi, naquela oportunidade, não se tratou sobre a questão da substituição processual, em ação coletiva, como previsto na Constituição Federal, na Lei da Ação Civil Pública e no Código de Defesa do Consumidor (CDC), o que gerou certa indefinição e segurança sobre o tema. Assim, ela lembrou que a legitimidade das associações civis nos processos judiciais depende da satisfação dos requisitos expostos na legislação, quais sejam: estarem constituídas há mais de um ano e possuírem, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao patrimônio público e social, ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência, aos direitos de grupos raciais, étnicos ou religiosos ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.
“O legislador entendeu por bem, assim, evitar que as ações coletivas fossem utilizadas de modo abusivo, restringindo, com esse propósito, o rol de legitimados para o exercício do direito de ação coletiva, atribuindo-a, de forma taxativa, entre outros legitimados, às associações civis”, esclareceu a ministra. Dessa forma, a tutela de interesses individuais homogêneos dispensa, inclusive, a autorização por assembleia.
Para a presidente do IDC, Lillian Salgado, essa é uma importante vitória da sociedade civil. “A substituição processual permite que terceiros possam pleitear, em nome próprio, direitos pertencentes a outras pessoas, por meio do ajuizamento de ações coletivas ou ações civis públicas, que gerarão, por sua vez, efeitos sobre todas as pessoas, não importando o lugar onde elas vivam, ou se são associadas ou não à entidade que entrou com a ação na Justiça. Esse é o ganho extraordinário que essa decisão do STJ traz para a comunidade como um todo”, comemora Lillian.
“Se a entidade é constituída como o objetivo de promover a defesa judicial daqueles interesses que são de toda a sociedade e não apenas de um indivíduo, não há razão para que, em cada nova demanda coletiva, seja promovida deliberação em assembleia para autorização”, explica Lillian Salgado, que identifica, na decisão do STJ, um marco na tutela de direitos coletivos, ao possibilitar, grande economia processual.
Inédito
A decisão também inovou ao afirmar que as ações coletivas são um direito da sociedade, podendo qualquer associação civil, com representatividade, suceder outra de igual natureza, seja qual for a razão dela ter sido extinta ou ter desistido da demanda judicial.
É a primeira vez que a sucessão processual de duas entidades de caráter civil é tratada pelo Judiciário brasileiro. Aplicou-se, por analogia, o parágrafo 3º do artigo 5º da Lei de Ação Civil Pública, ao afirmar que em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa. Nesse caso, a antiga associação havia sido extinta e o IDC a sucedeu na ação.
“É uma decisão inédita do STJ ao mostrar que as ações coletivas não são de titularidade exclusiva de ninguém. Na verdade, ela são da sociedade. Se uma associação é extinta ao longo do processo, qualquer outra que tenha essa representatividade poderá sucedê-la na defesa dos direitos da coletividade”, explica Lillian Salgado.
Assessoria de Imprensa Instituto Defesa Coletiva
RECURSO ESPECIAL Nº 1.800.726 – MG