Entenda o caso.

Em 2020, durante a pandemia de Covid-19, milhares de consumidores sofreram não só com as consequências da doença na saúde, mas também perderam empregos e boa parte da renda, o que impactou no pagamento das contas básicas, de empréstimos e financiamentos.

Aproveitando-se dessa situação de extrema vulnerabilidade e insegurança, a Febraban e algumas instituições financeiras, como Banco do Brasil, Itaú, Bradesco e Santander anunciaram a prorrogação das dívidas dos consumidores, pelo prazo de 60 dias. Porém, o que aconteceu, na verdade, foi a renegociação, com acréscimo de juros e encargos, deixando o débito ainda maior. Uma verdadeira PROPAGANDA ENGANOSA!

Neste artigo você entenderá por que essa conduta é ilegal e verá também:

– O que é propaganda enganosa.

– Qual a diferença entre prorrogação e renegociação de dívida.

– O que o Instituto Defesa Coletiva fez para garantir o direito dos consumidores.

– Qual foi a decisão da Justiça sobre o caso.

– Fui vítima da propaganda enganosa. Como devo agir?

– A importância da atuação das entidades civis para humanizar o mercado de consumo.

Leia até o final para conhecer o seu direito e saber como buscá-lo.

 

O que é publicidade enganosa?

 

Segundo o Código de Defesa do Consumidor (CDC), publicidade enganosa é aquela que induz o consumidor ao erro sobre a natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços (art. 37, § 1º do CDC).

Em outras palavras, qualquer comunicação que omita informações importantes ou apresente dados de forma confusa, que possa levar o consumidor a tomar decisões equivocadas, é considerada enganosa.

E foi exatamente isso que aconteceu no caso Febraban e dos bancos durante a pandemia de Covid-19.

Banco do Brasil, Itaú, Bradesco e Santander, com apoio da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), fizeram ampla divulgação da prorrogação das dívidas dos consumidores, pelo período de 60 dias. A forma como a publicidade foi elaborada omitiu a real intenção das instituições financeiras: renegociar as dívidas, com acréscimos de juros e encargos.

As propagandas veiculadas pelos bancos e pela Febraban usaram expressões como “jogar duas parcelas de seu empréstimo para frente”, “pausar”, e “prorrogar” como se fosse algo a ser feito sem custo. Entretanto, o que ocorreu efetivamente foi um verdadeiro refinanciamento (renegociação) dos contratos, com acréscimos de juros e de encargos.

Assim, milhares de consumidores, em um momento caótico de pandemia, foram induzidos a erro e tiveram enormes prejuízos com o aumento das dívidas de empréstimos e de financiamentos.

Mas para entender melhor a conduta ilegal dos bancos e da Febraban, por meio da publicidade enganosa, você precisa saber o que é prorrogação e renegociação de dívida.

 

Qual a diferença entre prorrogação e renegociação de dívida?

 

Prorrogação

é o adiamento do vencimento das parcelas de um empréstimo ou financiamento. Funciona como uma suspensão dos pagamentos, com a manutenção das mesmas condições do contrato original.

Renegociação

envolve a revisão dos termos do contrato original. Isso pode significar a inclusão de taxas de juros, a extensão do prazo de pagamento, com o consequente aumento do valor total devido.

 

No contexto das medidas anunciadas pela Febraban e pelas instituições financeiras Banco do Brasil, Itaú, Bradesco e Santander, durante a pandemia, é crucial entender a diferença entre prorrogação de dívidas e renegociação.Os bancos e a Febraban, na verdade, jogaram com estes termos e se aproveitaram da falta de informação e do momento de extremo desespero das pessoas para oferecer uma falsa ajuda aos consumidores. Anunciaram uma suposta prorrogação dos débitos por 60 dias, mas renegociaram a dívida, tornando o valor devido maior do que o original.

O Instituto Defesa Coletiva tomou conhecimento dessa ilegalidade e moveu uma ação civil pública, com o objetivo de fazer com que os contratos de empréstimos e de financiamentos voltassem aos seus termos originais, sem os juros da renegociação enganosa, e que os valores indevidamente cobrados fossem devolvidos em dobro para os consumidores.

E esses objetivos foram cumpridos e a vitória chegou! Veja. 

 

O que o Instituto Defesa Coletiva fez para garantir o direito dos consumidores?

 

A entidade civil recebeu milhares de denúncias de consumidores que tentaram prorrogar os seus débitos, nos termos das publicidades divulgadas pelos bancos, e não conseguiram.

Além disso, o Banco Central do Brasil informou que, durante a pandemia, no período de 01/04/2020 a 31/08/2020, foram registradas 13.843 reclamações sobre problemas com prorrogação de dívidas de empréstimos e de financiamentos.

Nesse contexto, o Instituto Defesa Coletiva agiu imediatamente para fazer valer o direito dos consumidores. Segundo a advogada Lillian Salgado, especialista no assunto e presidente do comitê técnico da associação “as publicidades relacionadas ao crédito, independente da modalidade, seja de concessão, suspensão ou prorrogação, devem ser claras e precisas para não induzirem o consumidor a erro, conforme o inciso III do artigo 6º, parágrafos 1º e 3º do artigo 37 e inciso IV do artigo 39, todos do Código de Defesa do Consumidor”.

Dessa forma, a partir do momento em que as instituições financeiras anunciaram a prorrogação sem custos adicionais, essa oferta deveria ter sido cumprida, nos termos do art. 30 do Código de Defesa do Consumidor[1].

E foi exatamente isso que o Instituto Defesa Coletiva requereu à Justiça, por meio de uma ação civil pública. Além da nulidade das renegociações prejudiciais aos consumidores, a entidade civil pediu o pagamento de indenizações por danos morais aos clientes prejudicados e que o benefício da prorrogação fosse estendido também para os contratos de empréstimos consignados.

A ação civil pública do Instituto mostrou ao Judiciário que os bancos receberam aporte financeiro para assegurar o bom nível de liquidez para o Sistema Financeiro Nacional e para fazer fluir o canal de crédito, dentre outras medidas de enfrentamento da crise ocasionada pelo Covid-19. Ao todo, as medidas anunciadas tiveram o potencial de ampliar a liquidez do sistema financeiro em R$ 1.217 bilhões, equivalentes a 16,7% do Produto Interno Bruto (PIB). “A prorrogação dos prazos de empréstimo e financiamento seria a contraprestação das instituições financeiras para promover a liquidez também aos consumidores. Assim sendo, é possível vislumbrar que a prorrogação das parcelas não é uma medida de solidariedade, tampouco de apoio voluntário aos consumidores, mas, sim, uma contraprestação decorrente das medidas adotadas pelo Conselho Monetário Nacional”, argumenta o advogado Márcio Mello Casado.

Nesse cenário, a conduta da Febraban e do Banco do Brasil, Itaú, Bradesco e Santander se tornou ainda mais grave e o Poder Judiciário emitiu uma decisão favorável a todos os consumidores que foram prejudicados pelas publicidades enganosas. Veja.

 

Qual foi a decisão da Justiça sobre o caso?

 

A ação civil pública do Instituto Defesa Coletiva foi julgada em conjunto com outros dois processos sobre o mesmo tema. A Defensoria Pública do Mato Grosso do Sul e o Ministério Público do mesmo Estado, bem como o Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (IBEDEC), também moveram ações contra a publicidade enganosa dos bancos e da Febraban.

Em razão da conexão entre as ações, as regras processuais do direito brasileiro determinaram que os processos fossem julgados juntos no lugar onde o primeiro foi ajuizado. Assim, a Vara de Interesses Difusos e Coletivos de São Luís no Maranhão se tornou responsável pela apreciação do caso.

A decisão foi favorável aos consumidores, acolhendo, inclusive, o pedido do Instituo Defesa Coletiva para que todos os tipos de contratos fossem abrangidos pela prorrogação, favorecendo as pessoas que negociaram empréstimos consignados à época da pandemia.

Veja o que ficou decidido.

  • Nulidade dos contratos de refinanciamento ou repactuação do saldo devedor que implicaram aumento do valor final do contrato refinanciado, formalizados enganosamente por pessoas físicas e pequenas e microempresas, a partir de 16 de março de 2020 e durante os 60 dias que se sucederam, fixando-se como única e exclusiva condição a situação de adimplência do contrato ao tempo da divulgação da matéria (16/03/2020) e limitado aos valores já utilizados.
  • Os bancos e a Febrabran foram condenados a restituírem, de forma dobrada (art. 42, parágrafo único, do CDC), os valores pagos pelos consumidores, especialmente a título de encargos (moratórios, remuneratórios e tributos) pela carência no pagamento das prestações, com juros de mora desde a citação e correção monetária a contar do desembolso, mediante desconto nas parcelas do contrato ou, caso já liquidado, por meio de ordem bancária em favor de cada consumidor afetado.
  •  Condenação dos bancos e da Febraban a repararem o dano moral individual de cada consumidor afetado, cujo valor foi fixado no percentual de 10% sobre o valor de cada contrato individual, mediante desconto nas parcelas do contrato ou, caso já liquidado, por meio de ordem bancária em favor de cada consumidor afetado.
  • Condenação dos bancos e da Febraban a repararem, solidariamente, o dano moral coletivo, mediante o pagamento de indenização no valor de R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais), a ser revertida em favor do Fundo Estadual de Proteção dos Direitos Difusos, criado pela Lei Estadual nº 10.417, de 14.03.2016.

 

Além de tudo isso, foi determinado que os bancos e a Febraban realizem a contrapropaganda. O que isso significa?

A contrapropaganda é uma medida punitiva prevista no art. 60 do Código de Defesa do Consumidor[2], que tem o objetivo pedagógico de desfazer publicidades enganosas, ou seja, as instituições financeiras e a Febraban terão de divulgar nos mesmos meio de comunicação, com o mesmo destaque e o mesmo tempo, novas propagandas, corrigindo as informações erroneamente passadas aos consumidores durante a pandemia.

Essa decisão é uma grande vitória para os consumidores brasileiros e agora você precisa saber como buscar a restituição e o dano moral garantido pela sentença.

 

Fui vítima da propaganda enganosa. Como devo agir?

Como visto, a publicidade enganosa do Banco do Brasil, Itaú, Bradesco e Santander e da Febraban atingiu consumidores em todo o Brasil, gerando grandes prejuízos.

Se você é consumidor pessoa física, pequena e microempresa pode ter direito à restituição dos valores pagos indevidamente durante a pandemia, em razão da cobrança ilegal de juros e encargos da prorrogação enganosa dos contratos promovida pelos bancos.

Da mesma forma foi assegurado aos consumidores prejudicados o recebimento de indenização por danos morais no valor de 10% da quantia de cada contrato.

E como você poderá acessar esses direitos?

O Poder Judiciário determinou que, após o trânsito em julgado da sentença, ou seja, depois que todos os recursos forem julgados, momento em que a decisão se tornar definitiva, os bancos e a Febrabran terão de comunicar os consumidores sobre o direito à restituição e ao dano moral, com a emissão das ordens bancárias para pagamento direto.

Portanto, o momento é de esperar e acompanhar o andamento da ação. Por isso, fique atento aos canais de comunicação do Instituo Defesa Coletiva e faça a sua inscrição para receber as atualizações do processo. Assim você não perde a chance de exercer seus direitos.

 

A importância da atuação das entidades civis para humanizar o mercado de consumo

 

A pandemia da Covid-19 trouxe desafios sem precedentes para a sociedade, impactando a saúde pública e a economia de forma devastadora, com sequelas que são sentidas até hoje. Em meio a crise, como visto, muitos bancos brasileiros prometeram auxílio financeiro aos consumidores, por meio da prorrogação de dívidas.

Contudo, a publicidade veiculada por essas instituições foi enganosa, agravando a situação crítica de muitos clientes. Os consumidores, já sob grande pressão financeira e emocional, foram induzidos a acreditar que a prorrogação das parcelas seria uma forma simples de alívio financeiro.

A realidade, contudo, mostrou-se diferente: a acumulação de juros fez com que muitas pessoas se vissem ainda mais endividadas. Essa prática não apenas falhou em oferecer a ajuda prometida, mas também agravou a vulnerabilidade financeira de muitos, configurando um ato de extrema crueldade e desumanidade por parte dos bancos e da Febraban.

Esse cenário elevou ainda mais a importância das entidades civis para assegurar um mercado de consumo mais justo, equilibrado e sustentável. O trabalho dessas associações, como o Instituto Defesa Coletiva, em colaboração com outros órgãos e entidades de proteção do consumidor, foi crucial para combater a publicidade enganosa.

A atuação em rede, neste caso, garantiu informação clara e transparente para os consumidores, com o adequado cumprimento da oferta e a reparação dos danos causados pela prática ilegal de publicidade enganosa.

Além da restituição para os consumidores prejudicados, o Instituto Defesa Coletiva conquistou um precedente judicial que desestimula futuras práticas enganosas por parte dos bancos e da Febraban. Isso é fundamental para a manutenção de um mercado justo, no qual condutas ilícitas são punidas e as práticas éticas são valorizadas.

Entretanto esse trabalho é constante e precisa cada dia mais de apoio, tendo em vista a disparidade de recursos entre as entidades civis e os grandes players do mercado, como os bancos.

Por isso, para nivelar o campo de jogo, e para que possamos lutar para que todas as empresas operem de acordo com normas legais e éticas, precisamos do seu apoio. Associe-se gratuitamente e faça parte da transformação do mercado de consumo.

 

[1] Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.

[2] Art. 60. A imposição de contrapropaganda será cominada quando o fornecedor incorrer na prática de publicidade enganosa ou abusiva, nos termos do art. 36 e seus parágrafos, sempre às expensas do infrator.

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